sexta-feira, 19 de setembro de 2008

De Campo Grande a Campo Grande III


Ainda os Jogos Para-Olímpicos- Excertos da opinião de um especialista, que esteve em Beijing


Jogos Paralímpicos e Inclusão

"Tive oportunidade de assistir em Beijing à abertura e a algumas competições dos chamados Jogos Paralímpicos.
Os meus comentários são inumeráveis mas gostava de regressar a uma conversa que tive com um amigo meu antes de partir.
Em síntese ele perguntava-me “ o que é que uma competição que se passa só entre pessoas com deficiência ( e destas só com algumas deficiências dado que as pessoas com deficiência auditiva ou intelectual não participam) tem a ver com o movimento da Inclusão”? . (….)

1. Antes de mais as pessoas com condições de deficiência (PCD) são rejeitadas para efectuar práticas desportivas (sejam elas de rendimento ou de simples manutenção) em estruturas "regulares" (digo "regulares" entre aspas porque uma estrutura que assim segrega as PCD parece-me muito mais "irregular"). (…)

2. Os Jogos Paralímpicos celebram a diferença e valorizam o desempenho de pessoas que em condições adversas conseguem desempenhos espantosos. Desafiava os meus leitores a se informarem qual é a marca que uma pessoas amputada do membro inferior salta em altura.
Trata-se aqui não de valorizar só a performance humana (um corpo como uma magnífica máquina) mas de valorizar o que é possível fazer face a uma circunstância. Assim, o desporto Paralímpico abre novas perspectivas sobre as possibilidades humanas. Talvez antes desta organização existir não soubéssemos que se pode nadar sem braços ou sem pernas ou mesmo sem uns e outros. (…)

Mas que fique claro: não foram as PCD que se colocaram "à parte": elas foram colocadas à parte e quando se organizaram para poderem ter acesso à prática desportiva e à competição, assim mesmo nos dão exemplos de abertura e de solidariedade.

Prática desportiva não segregada? Sim, vamos a ela, mas não esqueçamos que vai implicar um novo conceito de desporto. Um desporto que se assuma diverso como a humanidade, que recupere os valores lúdicos e que se desenvolva mais numa linha horizontal do que numa hierárquica pirâmide.

Os Jogos Paralímpicos são assim uma celebração da diferença e são uma prova cabal que o termo "deficiente" ("não eficiente") sempre foi um disparate e um anacronismo. Bem-vinda pois a mediatização dos Jogos para abrir as bocas e os corações. (E sabem que pessoas sem braços comem, na China, o seu arroz com os pauzinhos manuseados pelos pés?)"

David Rodrigues

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