A indisciplina na sala de aula não é um assunto fácil de abordar. Há casos que ultrapassaram os muros das escolas, tornados públicos e comentados até à exaustão. A comunidade escolar sabe que o tema é delicado. Há mais casos ou menos tolerância para a má educação dentro das escolas? Como lidar com o assunto? O que fazer para que as faltas de respeito não se tornem numa rotina? Os exemplos são importantes, as relações interpessoais devem merecer toda a atenção e o desenvolvimento de competências de autocontrolo e autorregulação na infância pode fazer toda a diferença. (...)
Margarida Gaspar de Matos, psicóloga e investigadora da Faculdade de Motricidade Humana da Universidade Técnica de Lisboa, aborda o assunto da indisciplina, em primeiro lugar, pelo lado das relações interpessoais. Os exemplos são muito importantes. "Quando os adultos estabelecem uma cultura onde o mais forte é o mais grosseiro e o mais rude, e onde o que grita mais alto é o que aparenta mais poder... enquanto modelos destes cenários abundarem em circuitos públicos, entre adultos, aí começa a ser difícil convencer os jovens a fazer de outro modo", observa.
Tentar copiar o que se vê é uma prática comum e, segundo a investigadora, as relações interpessoais estão a ser modeladas por "exemplos pouco corteses", como telenovelas, séries televisivas, videojogos, relações entre políticos. "E este modelo social é passado aos jovens que o adotam como um modo de relação." Uma realidade que poderia ser repensada. "Esta descortesia e desrespeito pela afabilidade nas relações interpessoais não é apanágio da juventude: os jovens espreitam-na em casa, entre professores, na televisão, na rua, nas lojas e apreendem o 'estilo', depois, muitas vezes, quando o usam não tomam a devida distância face aos contextos", acrescenta.
Segundo Margarida Gaspar de Matos, as pessoas estão mais exigentes nas situações de indisciplina e de bullying nas escolas, mas só ficam assustadas porque, na sua opinião, nem sempre o mediatismo dado aos casos tem sido a estratégia mais adequada para lidar com essas questões. Agressões a professores, indisciplina, má educação na sala de aula são fenómenos diferentes entre si e diferentes do bullying. "A indisciplina está muito associada, por um lado, ao insucesso escolar, ao desinteresse pela escola e à falta de expectativas de futuro e face ao papel da escola e da aprendizagem/escolaridade nesse futuro", refere. A "tremenda desvalorização do papel do professor" é também um aspeto a ter em conta.
A legislação existe, o problema tem sido a sua concretização. "Em várias questões educativas, as coisas são implementadas sem haver um estudo de necessidade e de viabilidade; as coisas mudam sem serem avaliadas e sem terem tido tempo de dar frutos, e professores e alunos andam confusos com tanta entropia." E a confusão desmotiva. "Uns professores desmotivam, outros adoecem, outros nem ligam, outros afligem-se de mais. E os alunos, uns lá se vão aguentando, mas muitos não desenvolvem as suas qualidades pessoais e académicas, outros entram em trajetórias alternativas, desviantes e antiescola ou, pelo menos, antiaulas". Em seu entender, faz falta uma cultura de coesão social e de equidade na diferença e uma competência de regulação das relações interpessoais com normas de cortesia. "Se os adultos fizerem isso, as crianças vão aprender mais depressa do que se forem violentamente admoestadas", comenta. (...). |
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